IMMANENCE IS IMMINENT
La luz de una única vela iluminaba
aquella mesa larga y las líneas de la grande massa de animales, haciendo sus nidos y tocas por tantos lugares inóspitos, donde sólo los condores se animan a sobrevolar (porque todo el cielo parece um hilo de ar), rara oportunidad para descansar de todas las calles y avenidas já transitadas tantas vezes. Jamás intenté hacer del cielo mi casa. Una vez fuimos descalzas a la iglesia y con ese único gesto cambiamos la hora, el día, los astros, y los anillos de saturno giraban como un ula ula en las caderas de tu caligrafia, una nueva forma de aprender idiomas. É caminando que se llega a algún día primero. El primer día y nada más.
Todas as paisagens que já percorremos a percorrerem-nos
aqui os braços
princípio de asa
não me matam
princípio de pata
adormecem crianças
princípio de garra
criança-ninho
princípio de raça
mulher que passa
e das flores
Abri a porta para a rua e Lisboa estava deserta. Nem um pássaro. Corri depressa pela Sé, Largo de Santo António, Rua da Madalena, Arco da Rua Augusta, atravessei o Terreiro do Paço e parei no cais entre as colunas. Ninguém pelo caminho. À minha frente estendia-se uma distância enorme. Não havia rio, o Tejo estava vazio como a cidade e no lugar da água estava um vale de lama a secar entre as margens. No centro, lá em baixo, uma espreguiçadeira branca e um homem sentado de copo na mão. Não sei o que bebia, talvez whisky. Era o Siza Vieira que levantava os pés ao Sol e se inclinava naquela manhã despovoada, no fundo do rio seco. Admirava a Ponte com as suas lages e fundações à vista, como se fosse uma mulher despida da sua água. O olhar dele deslumbrado com a nudez que, pela imobilidade do metal, não conseguia tapar-se. Senti a vergonha da Ponte, o seu pudor ligando as margens, de braços abertos para mim e para o espanto dele.
São reagrupa
das pelo amor as formas naturais
Jorma Puranen, Ana Hatherly, Margarida Mendes, Gustave Guillaumet, Matilde Real, Helena Helft, Mumtazz, Georgia O'Keefe, Karl Blossfeldt, António Poppe, Tara Mexis, Pavel Tavares, Clara Queiroz Lopes, Margarida Vale de Gato, Alice Albergaria Borges, Peter Bastiaan Zin, Marie-Agnès Then, pastor Rui, Nicolau da Costa, Joana Guerra, Claire Chroston
Limpar um terreno de silvas, limpar o movimento de uma dança. Reparar um armário partido, reparar nas relações entre os corpos no espaço. Aquecer um almoço, aquecer a voz. Compor um ramo de flores, compor uma canção. Tocar um chocalho, tocar um violoncelo. Coser umas calças rasgadas, coser os momentos de uma sequência. Pintar um quadro, pintar uma parede. Cuidar uma manada de vacas, cuidar as palavras de um poema.
RIAT EMIR SENI MALA JAUNA
ODRACI MAR ONONA GEO FIÁZO
ODRACIR LAMA TILDEMA NIONA
NUAJA ONI EMAR FIAZÓ
ODRACIR LAMA EMIR SENI MALA
NUAJA ONI TILDEMA NIONA
Um fio desdo princípio de tudo - alguém que cuidou de alguém que cuidou de nós. O corpo comprova. Pele procura pele. Viva a vida dos vivos e a vida dos mortos!
ponderemos e vejamos
que ganhamos em viver
os que nascemos:
veremos que não ganhamos senão algum bem fazer,
se o fazemos.
Camões, Cartas de Ceuta
Ambientalidade
Vento e Sol
Água e Rocha
Sol e Água
Vento e Rocha
Sol e Rocha
Água e Vento
Água e Água
Sol e Sol
Vento e Vento
Rocha e Rocha
Se o Universo fosse um bicho, o seu nome seria Isto.
Caminhar a corrente a favor de tudo
um passo que anima a corrida exemplar ao vento
Como encher os segundos negros de caos e cordas
Caos e cordas à segunda e terceira hora.
Água prisioneira de movimento moluscular
Uma catedral de plástico a favor do tempo, a favor do som do vento
A desilusão de uma noite que se repete
É o retorno do pensamento
Um anel antepassado que já não sai.
Não sabemos perder as coisas.
Em vez de retiros, implicações!
Descascar a manhã numa laranja
Des des des: start again.
Mumtazz.
O véu de uma mulher recortada contra o Universo
A favor da corrente
A favor do som do tempo
Moluscular
Um enxame que respira
Véu vazio esquecido por baixo de um banco de marfim
As coisas começam a ganhar forma branca
Escrever ao vento
Sou a favor de tudo
O feitiço que regressa
Start again: recomeçar
Implicada no quotidiano dos pássaros
Não há momentos acabados
O infinito ao perto
Uma onda que hesita
Repescar a frescura do salto alto-mar
A urgência do fogo
É claro no rosto
Alegria
Uma onda que repara
Fazer ligações
Organizar o funeral dos pássaros
Dores de caminhar a favor da corrente
Gastar tudo de tanto usar os mesmos sapatos
É a praia que repara
Voltar a casa
Start again
Sair, soltar o medo em bando
Tambores na noite
É a selva que regressa ao caracol dos ouvidos
Som do tempo a descascar
Um convite para cair
Bando de andorinhas encolhido
O dia que nos prepara para continuar a retroceder
Enrolemos a espiral de volta à nascença do primeiro peixe
Povo que desova
Sobre outras palavras escrevo
Mil prelúdios de selva
Ossadas de gazela que correm ao longe
Nado no soalho de tijoleira
Uma verdadeira dança inicial
Comandado o gesto por multidões de crianças que tocam música ao longe
Está escuro dentro do osso
É da idade do trovão que acorda
Silêncio caro das gargantas
Um presente que não aceitei
É África que regressa aos montes pelo vento
Vamos para Sul
Atravessamos os insectos de fogueiras nascentes
Um ensaio de gerúndios a afinar as últimas sílabas
Entre as palhas secas da savana.
Há qualquer coisa que suga
O parto das ideias proibidas.
És um esplendor ao espelho
Oráculo familiar abandonado
Há qualquer coisa que me ouve
É o osso amador
O osso que nunca correu
E traz a lembrança do rudimentar
Uma pedra assombrada
O próximo instante
Vertiginosamente escapando pelo infinito adentro
Cordas em par
És um lápis que desafina
A cópia perfeita do futuro.
Nos livros ao relento a terra cai
Cai o céu sobre as letras
E causa espaço sem significado
Voos a matar todos os símbolos
A mesma noite.
Há qualquer coisa que me atravessa sucessivamente o louco do deserto ao vento
Cada pele, cada passo, cada po-ssi-bi-li-da-de perdida no mapa
O facto, o faz-de-conta boreal.
Há qualquer coisa crescente nos pés
Animação rasteira
Convidamos as flores a descalçar o céu
Queremos um tsunami
Num espaço entre dentes
Multiplicação da memória pelo pó dos números
descobrimos a espiral das perguntas dentro da língua
Tudo o que ajuda a direcção da corrente.
Há qualquer coisa que assobia perguntas
Por baixo do chão.
A panorâmica anatómica dos sonhos antigos
Um arquitecto de precipícios
A formulação matemática do abismo
pela boca de uma criança.
A tabuada é um mantra metálico
Que nos oferece a repetição.
Se eu cair
Peço ajuda ao embrião gentil que observa a queda
vértebra que encaracola a travessia
Desce desce desce
Do nada a qualquer coisa.
Na infância da montanha
foi onde cresceu o primeiro canto
Apenas sopro sem música
Um símbolo sem palavra
É a mãe que canta
É a avó que conta
Árvores de pele e músculo
Futuros ossos ao Sol
Memórias de amor.
Há qualquer coisa que dissolve o que se sente
Na extraordinária dança derramada sobre o tempo
Habibi é o continente que falta
Pangeia cosida de novo
É o novo capítulo detodos os mares
Quando o céu cair
Ainda haverá uma flauta que sopra
O novo desejo das novíssimas humanidades.
Ultra-corrente
Pedra transcelestial
A importância de uma desilusão em Júpiter
Qual é a órbita que permanece?
Esta é a hora dos pássaros maiores
Convoco a multidão a favor de tudo
A despedida é antes de tudo
Mecânica da libelinha que se oferece ao azul
Passar a mão nas costas da flor
Regressamos a casa pelo desenho da mata
Há qualquer coisa que me espanta
Uma noite vazia de afecto
O primordial a reclamar sobrevivência
Sem ar na garganta para descrever coisas possíveis
Marcas de dedos atrás do peito
Um sorriso planetário às escuras.
Há qualquer coisa que sente a gravidade da terra numa galáxia distante
E engravida o peso das pedras
Antes de nos fecharmos atrás da pétala
Mergulhamos a cabeça das feras
No molhado entre planetas
Estamos tão espalhados quanto possível
Pelos pontos para-lá-de-cardeais.
Há qualquer coisa que se lembra sempre dos meus medos
Cresce a mandíbula do apego à identidade imperfeita
Um grito disfarçado de grilo que decora a noite
Uma pequena sílaba suspensa entre duas certezas
Lavrar o inconsciente
Sabemos o número de sofrimentos redondos
Em euros, reais moedas de troca
Para confundir o inadiável truque de circo
Mortal encarpado no avesso do abismo.
Caminho pela corrente em todos os sentidos e há qualquer coisa silenciosa
Que se imagina
Dueto pouco ensaiado entre as metades de um novo ser.
A promessa de uma profissão especialista em unidades
A criação da palavra Isto.
Convocamos uma multidão para reinvidicar mais coincidências
Um interrogatório ao universo
Que proíbe explicações.
Somos naufrágios no sangue
A órbita vertiginosa da Lua dentro da pele.
Sou todas as pessoas que não conheci em forma comestível
O universo em prosa
A autobiografia das plantas.
Há qualquer coisa que se escreve em vez d’Isto
Há qualquer coisa em vez da palavra
A palavra por trás da coisa
Somos os erros ortográficos das linhas rectas
Dois instantes encavalitados no presente
Sou uma coincidência que se achou importante
O acaso de costas
E há qualquer coisa que oferece gargalhadas ao esforço da obra humana.
Há qualquer coisa que escapa à electricidade
Convocamos a multidão para estar de acordo com a noite
Direito fundamental do ilegível
A terceira parte do átomo
A primeira cara do medo
Sempre que alguém repara duas vezes
No mesmo instante
Manifesto para contra-atacar os relógios
Estamos de acordo com tudo o que não é sólido
A noite adentro
O que os outros pensam
O meio do mato às escuras
A alegria dos objectos
Simplificar o pôr do Sol
Para que tudo se espalhe em si mesmo
Sombra coincidente com o cão.
Há qualquer coisa que sobe em forma de dúvida
As cordas de um cavalo
Respirar pelos orifícios do riso
A contradança dos búzios
Mulher ao mar
Um pequeno almoço de conchas
Há qualquer coisa que não se conta
Pêlos que sobram de uma ninhada
Terramoto que adormece
Trás-os-montes de volta
Som que derrama sobre o sonho
A primeira respiração de um peixe
Há qualquer coisa caramelizada na palavra
Uma corrida boreal
Saturno de pé no rio
Escreve-se quase às escuras
Fazem-se compras às árvores
Uvas com batimento cardíaco
Respirar uma vela
As palavras estendidas ao calor
Um ganido.
Há qualquer coisa desértica na primeira sensação da matéria
Isto pode começar noutro lugar
A flora do pensamento
Escrever em oitava pessoa do plural
Onde a pessoa é fungo e arritmia.
Há qualquer coisa desdobrável no verbo
Queda do céu
O primeiro som foi glaciar.
Há qualquer coisa que escapa às repetições
O que está dentro da pedra
O desacelaramento cardíaco a tender para zero
Escrever o lápis até ao início.
Há qualquer coisa na transumância dos animais perdidos
Um pai a conversar com um filho em monólogo genético.
Há qualquer coisa que não acaba
Mesmo depois de nós
O largo ao longe
A triangulação dos versos
A montanha ao vento
A organização das formigas.
Há qualquer coisa de que não se fala
Os livros empilhados no ângulo certo do acaso
As formas do amor reconfiguradas pela dança
Os animais das bandeiras e dos hinos
Somos a favor da corrente
Uma basílica em nona pessoa
Queremos a dor ao perto
Família em espiral de órbitas secas
O pensamento cigano das ideias nómadas
Um gesto afiado
O desconcertar do espaço aberto em queda livre
O paraquedista que se atira frase abaixo
Somos danças de pulsos
Mãos que giram a outros tempos
Somos todas as variantes do fogo
Cúmplices de objectos e milagres
Um turbante esticado na diagonal
ser feliz é como respirar
Solidão conquistada. Não queria ser compreendida. Encontrava prazer em cair ao chão. Fazia bolos de relva e terra que dava a provar aos insectos amigos. Aprendeu a ler e morreu parte da alma. Não amava de forma consciente. Corria a olhar para trás, corria distâncias incalculáveis para tocar a parede e voltar, para experimentar aquele chão, pisar aqueles degraus que ao longe pareciam deliciosos. O idioma era o movimento, e a queda, moeda de troca. Partilhava os pensamentos da paisagem e não se deixava enganar pelo ar de certos sítios. Não tinha nome. Tinham-lhe dado um nome mas o nome não a era. Existiam lado a lado. Trazia o nome no bolso e deitava-o pelo cano do lavatório quando os adultos não estavam por perto. Mas ele voltava sempre pela boca dos pais. Levava uma maçã escondida, que não comia. Era essencial, caso decidisse nunca mais voltar a casa. Confiava cegamente no corpo. Atirava-se por ladeiras, contra vidros, entre buracos nas rochas e sabia que a morte tapava os olhos e fingia não reparar. Cada momento se desdobrava em infinitos e ela coleccionava o dia em prismas do presente, vivendo a cada instante o porquê das coisas.
Escrevo para não me atropelar com as palavras ao falar-te, ao tentar explicar o que não tenho conseguido. Escrevo para me dar a ver a ti, em verdade e completa abertura. É um chamamento. Há momentos em que somos chamados a aparecer perante nós próprios, olhar o mundo, ver a alegria interna de todas as coisas, admitir o que não está bem: assim nos salvamos de uma meia-vida, meia-verdade, meia-vontade. O encontro com o outro, o real e verdadeiro encontro é um desses momentos. O amor é o maior convite que sei para nos vermos pelos olhos de alguém. Para nos vermos, dessa forma, pela primeira vez. Abana certezas, fortificações que edificámos. O amor, sinto, é um possível renascimento de tanta coisa, se for recebido e oferecido como tal. Ao ter-te conhecido percebo tanto em mim que pode mudar, encontro vias que nunca antes se tinham aberto. Vejo formas de crescer, de encontrar beleza, contínuo questionamento, desconforto sobre quem sou. Tudo é valioso. Quero dar, oferecer energia, esquecer-me de que custa e dar. Implica sair, esticar-me a esse outro, ao teu mistério e complexidade. Quando consigo, tudo fica cheio. Depois difícil outra vez, e começo, recomeço, e custa, e tudo se ilumina. E vejo cada vez mais que essa partilha, a queda das defesas internas, das fronteiras, vale a pena.
Sei que por vezes te convoco para conversas desconfortáveis. Se não te chamasse para estes assuntos era sinal de que não estava disposta a trabalhar o nosso encontro, a nossa vida partilhada. Mas tudo aquilo que te digo quando sinto que estás triste, distante, que falta algum afecto ou atenção, não deve ser visto como se te apontasse um dedo ou me desapaixonasse, perdesse o interesse. É o contrário, é exactamente o contrário! Claro que é desconfortável, é mais fácil ouvir o que está bem. É mais fácil dizer o que está bem. Mas tenho de dizer o que não está porque encontrei em ti essa coisa tão misteriosa, tão preciosa, que quero salvar com toda a força. Faz o mesmo comigo. Diz aquilo que sentes nos momentos mais difíceis para eu poder reagir, melhorar, abrir-me a essas chamadas de atenção. Coisas que posso nem saber que existem, que são convites para que me transforme.
Sinto-te desencontrado, sem energia para oferecer. Dizes que precisas de tempo. Confio nesse tempo que tens para te dar. Mas durante esse tempo reconcilia-te contigo da forma que achares melhor. Eu irei estar ao teu lado para partilhares aquilo que quiseres, se o quiseres. Faz desse tempo uma verdadeira cura, e isso não é adiável. Começa agora, a cada momento. Não adies essa recuperação. Requer coragem, energia, força. Requer saíres um bocadinho de ti em direcção ao Outro, seja quem for. Se pensas que foste sempre assim, que me arrastas por causa de quem és, ouve, sem esforço, abre-te e larga quem pensas que és, a imagem que construíste para ti. Vale a pena esquecer. Larga as crenças que tens, renova-te, dá, e não recebas estas palavras como um ataque, um apontar de fragilidades e feridas que possas ter. Eu também tenho as minhas e escolho abri-las contigo, se assim o quiseres. É a única forma. É Amor.
esta palavra vai salvar-nos
Matuto o futuro do útero matuto
Tu e tu e tudo
Tão quente aqui dentro entretanto
é longo e lento o tic tac do canto
quem, quando?
escrever em oitava pessoa